O noivo da vítima não pode pleitear judicialmente indenização
pela morte da futura esposa. A decisão, da Quarta Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), negou legitimidade ativa para o noivo, alheio
ao núcleo familiar da vitima, em vista do risco de pulverização da
indenização e em analogia à ordem de vocação hereditária.
Para o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso, a leitura
sistemática da legislação nacional aponta que o espírito do ordenamento
jurídico afasta a legitimação dos que não fazem parte do núcleo familiar
direto da vítima. “Onde houver a mesma razão, haverá o mesmo direito”,
afirmou o relator, para sustentar a legitimação segundo a ordem de
vocação hereditária.
Afeições presumidas
“Tanto na ordem de vocação hereditária, quanto na indenização por
dano moral em razão de morte, o fundamento axiológico são as legítimas
afeições nutridas entre quem se foi e quem ficou. Para proceder à
indispensável limitação da cadeia de legitimados para a indenização,
nada mais correto que conferir aos mesmos sujeitos o direito de herança e
o direito de pleitear a compensação moral”, asseverou.
Segundo o relator, a lei aponta uma ordem para a sucessão, fazendo
suprir a vontade presumida do falecido, em vista de pressupostas
afeições familiares. Esse seria o fundamento metajurídico que justifica
primeiro herdarem os filhos e cônjuge e só depois os parentes
colaterais.
“Parece razoável estabelecer o mesmo fundamento para a criação de uma
ordem de legitimados para receber indenização pela dor moral decorrente
da morte de ente querido, porque aqui também o valor jurídico
justificador se alinha aos valores inseridos na ordem de vocação
hereditária”, considerou o ministro.
Ele realçou, porém, que cabe ao magistrado analisar cada caso para
apurar a particularidade da relação familiar específica. O ministro
citou exemplos legítimos de indenização concedida a sobrinho e a sogra
de vítimas que faleceram.
Pulverização
Porém, a indenização deve ser considerada de modo global para o
núcleo familiar, sem direcionamento para cada membro da família,
evitando-se a pulverização de ações de indenização.
Segundo o ministro, conferir possibilidade de indenização a sujeitos
não inseridos no núcleo familiar da vítima acarretaria diluição dos
valores devidos, em prejuízo dos que efetivamente fazem jus à
compensação.
“Se, por exemplo, familiares e não familiares ajuizassem uma ação em
conjunto, tal diluição necessariamente ocorreria. Caso os familiares
ajuizassem separadamente as ações, o juiz deveria ponderar a
possibilidade de futuramente outro ‘legitimado’ intentar a mesma ação, o
que, além de prejudicar os familiares diretos, geraria também, no
mínimo, desordem no sistema”, afirmou.
Inferno de severidades
Para o ministro, a par da reparação integral do dano, o ordenamento
também rechaça as indenizações ilimitadas, com valores nitidamente
desproporcionais, a fim de evitar um “inferno de severidades” ao
causador do dano. “Esse exagero ou desproporção da indenização estariam
presentes caso não houvesse – além de uma limitação quantitativa da
condenação – uma limitação subjetiva dos beneficiários”, explicou.
“Conceder legitimidade ampla e irrestrita a todos aqueles que, de
alguma forma, suportaram a dor da perda de alguém – como um sem-número
de pessoas que se encontram fora do núcleo familiar da vítima –
significa impor ao obrigado um dever também ilimitado de reparar um dano
cuja extensão será sempre desproporcional ao ato causador”, completou o
relator.
Conforme o ministro, o dano por ricochete aos não integrantes do
núcleo familiar direto da vítima de morte, em regra, não deve ser
considerado como decorrência do ato ilícito, tanto na responsabilização
por culpa quanto na objetiva, porque extrapola os efeitos razoavelmente
imputáveis ao agente.
Caso concreto
O processo analisado trata de vítima de 19 anos que foi arremessada
para fora de um ônibus. Em dia de “apagão” na cidade, ela havia se
sentado no primeiro degrau da escada interna, mas no fechamento da
porta, foi lançada à rua e sofreu traumatismo craniano. Os demais
passageiros teriam alertado o motorista antes de ele acionar o
mecanismo. Ela faleceu alguns dias depois.
O ministro destaca que, no caso, os pais da vitima já haviam obtido
indenização, em ação judicial, pelos danos morais decorrentes da morte
da filha. “Como o exame da questão se situa apenas no campo da
legitimidade à causa, e o autor afirma na inicial que foi noivo da
vítima, e não companheiro, inafastável sua ilegitimidade”, concluiu.
Processos: REsp 1076160
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