Quando a conduta de uma pessoa é direcionada ao fim ilícito de
causar dano à outra, por meio de violência física, e sendo caracterizado
o dano moral, o magistrado deve reconhecer o caráter punitivo e
pedagógico ao fixar o valor da reparação, sem se esquecer da vedação ao
enriquecimento sem causa da vítima.
Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) reformou decisão para aumentar de R$ 13 mil para R$ 100 mil o
valor da indenização por danos morais a ser paga por dois homens que
espancaram outro, o qual involuntariamente havia provocado acidente de
trânsito.
Agressão
Em 1998, o condutor de um veículo bateu na traseira de um Jeep
Cherokee. Segundo o processo, após provocar o acidente, ele foi
violentamente agredido pelo condutor e pelo passageiro do outro veículo
envolvido. Eles o retiraram do seu carro à força e o espancaram com
chutes e socos em várias partes do corpo. Enquanto um segurava, o outro
batia.
Consta no processo que, como consequência do espancamento, a vítima
ficou com várias lesões, principalmente na face – nariz quebrado em três
lugares, visíveis cortes nas sobrancelhas e na base esquerda do nariz e
grandes hematomas nos olhos. Além disso, a agressão trouxe sequelas
emocionais e psíquicas.
O homem agredido ajuizou ação indenizatória – por danos morais,
estéticos e materiais – contra os dois homens que o espancaram. O juízo
de primeiro grau reconheceu os danos morais, fixando a reparação em 250
salários mínimos contra cada um dos agressores.
Antes de fixar o valor da indenização, ele conferiu nas declarações
de Imposto de Renda que os réus têm boa situação financeira (são donos
de fazenda e comércio).
Pedidos não acolhidos
Entretanto, o magistrado não acolheu o pedido de indenização por
danos materiais e estéticos. Para ele, os danos materiais alegados não
foram comprovados. O dano estético também não foi caracterizado, visto
que as cicatrizes deixadas no rosto do homem ficaram visíveis apenas na
parte interna do nariz, não sendo consideradas deformidades permanentes.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou a decisão do juiz,
fixando o valor da indenização em R$ 13 mil, para os dois réus, com
correção monetária e juros moratórios.
Para tal reforma, baseou-se nos parâmetros da 49ª Reunião do Centro
de Estudos Jurídicos Juiz Ronaldo Cunha Campos (realizada em 2008, para
uniformizar e orientar os julgamentos sobre valores de indenização por
dano moral). Segundo esses critérios, o valor indenizatório fixado pelo
juiz singular seria excessivo para o caso de lesão corporal,
equiparando-se à indenização pela perda de um ente querido.
Valor irrisório
A vítima recorreu ao STJ pretendendo restabelecer o valor da
indenização fixado na primeira instância (500 salários mínimos).
Sustentou que a redução para R$ 13 mil tornava a reparação irrisória, o
que, segundo ele, possibilitaria a revisão do valor pelo STJ.
O ministro Raul Araújo, relator do recurso especial, explicou que,
para fixar adequadamente o valor da reparação por danos morais, nos
casos em que a atitude do agente é direcionada ao fim ilícito de causar
dano à vítima, o magistrado deve considerar o bem jurídico lesado e as
condições econômico-financeiras – tanto do ofensor, como do ofendido.
Deve considerar também o grau de reprovação da conduta do agente e a
gravidade do ato ilícito.
Para ele, a atitude dos agressores não se justifica pela simples
culpa do causador do acidente de trânsito. O ministro lembrou que todos
são suscetíveis de provocar acidentes e disse que isso torna ainda mais
reprovável o comportamento agressivo e perigoso dos réus, que usaram
força física desproporcional e excessiva para se vingar da ofensa
patrimonial que sofreram.
O ministro deu razão à alegação sobre o valor irrisório da
indenização fixado pelo tribunal estadual, visto que é incompatível com a
gravidade dos fatos. Ele explicou que, nesse caso, o STJ está
autorizado a rever o valor da reparação.
“Considerando o comportamento doloso altamente reprovável dos
ofensores, deve o valor do dano moral ser arbitrado, em atendimento ao
caráter punitivo-pedagógico e compensatório da reparação, no montante de
R$ 50 mil, para cada um dos réus, com a devida incidência de juros
moratórios (desde o evento danoso) e correção monetária”, concluiu Raul
Araújo.
Processos: REsp 839923
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