Embora o empregado de empresa pública não detenha a estabilidade
prevista no artigo 41 da Constituição da República, um aeroportuário da
Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) demitido
sem justa causa conseguiu ser reintegrado ao emprego. A Subseção 1
Especializada em Dissídios Individuais (SDI1) do Tribunal Superior do
Trabalho proveu seu recurso por entender ter sido discriminatória a
dispensa, ocorrida após ele ter ajuizado ação trabalhista contra a
empresa.
O aeroportuário, admitido por concurso público em 1990, fazia parte
de um grupo que ajuizou ações trabalhistas contra a Infraero no período
de julho de 1988 a fevereiro de 1999, pleiteando o pagamento do
adicional de quebra de caixa e de periculosidade. A empresa ameaçou-os
de demissão caso não desistissem das ações. Os que desistiram mantiveram
seus empregos e os outros, como ele, foram dispensado em abril de 1999.
O juiz da 3ª Vara do Trabalho de Porto Velho (RO) rejeitou o pedido
de reintegração do aeroportuário, por entender que ele é regido pela CLT
e, por isso, não tem direito à estabilidade destinada aos servidores
públicos. O Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região (RO) citou a
Súmula 390 do TST, segundo a qual não há estabilidade para o empregado
de empresa pública, para considerar correta a decisão de primeiro grau
quanto à não reintegração. No entanto, entendeu que o trabalhador tinha
direito a uma reparação por danos morais pelo fato de a dispensa ter
sido discriminatória, e condenou a empresa a pagar 12 parcelas do seu
último salário a título de indenização.
Dessa decisão, o aeroportuário recorreu ao TST. A Segunda Turma, ao
julgar o recurso de revista, manteve o acórdão regional, que considerou
de acordo com a jurisprudência da Corte, consolidada na súmula citada.
Discriminação
Na SDI-1, o relator dos embargos interpostos pelo aeroportuário,
ministro Ives Gandra Martins Filho, disse que o exercício do direito
potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites, e
que existem inclusive decisões do Supremo Tribunal Federal nesse
sentido. Ele transcreveu trechos de um acórdão do ministro Marco Aurélio
Mello segundo o qual “o direito potestativo de despedir não pode ser
potencializado a ponto de colocar-se em plano secundário o próprio texto
constitucional”. Para o ministro do STF, se de um lado se reconhece o
direito do empregador de fazer cessar o contrato a qualquer momento, sem
que tenha de justificar sua conduta, de outro não se pode esquecer que o
ato deve ocorrer sob a proteção da lei, que não autoriza a demissão
“como via oblíqua para se punir aqueles que, possuidores de sentimento
democrático e certos da convivência em sociedade, ousaram posicionar-se
politicamente, só que o fazendo de forma contrária aos interesses do
copartícipe da força de produção”.
Para o ministro Ives Gandra Filho, a dispensa foi discriminatória, e a
conduta da Infraero, no sentido de impedir o acesso ao Poder
Judiciário, impede a harmonia entre o Executivo e o Judiciário. “Amparar
o empregado nessa situação é assegurar que a Justiça do Trabalho não se
torne a Justiça do desempregado”, afirmou, defendendo a correção da
inversão de valores no processo, “sob pena do esmaecimento das nossas
instituições, que não podem admitir o desprezo de conquistas históricas,
que alimentam o Estado Democrático de Direito”.
Na sessão de julgamento, o presidente do TST, ministro João Oreste
Dalazen, considerou que o caso é um exemplo típico de abuso de direito,
“em que se sacramenta uma despedida imediatamente após o exercício do
direito constitucional de ação”. Dalazen manifestou-se de pleno acordo
com o voto e cumprimentou o relator “por sua sensibilidade e tirocínio”.
Por unanimidade, a SDI-2 decretou a nulidade dos atos da demissão e
condenou a Infraero a reintegrar o aeroportuário a seus quadros e a
pagar os salários e demais vantagens do período de afastamento. Também
arbitrou em R$ 12 mil a indenização por danos morais.
(Lourdes Côrtes/CF)
Processo: RR-7633000-19.2003.5.14.0900
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